segunda-feira, 29 de novembro de 2010

HORA DE SE FAZER A FANTASIA


Ele é um dos mais talentosos e também subestimados quadrinhistas do underground carioca. Seus quadrinhos fazem chorar o skinhead mais thug, e causa fúrias nos nerds mais Blasés. Confira essa conversa que tive com o amigo e mestre: ROBERTO HOLLANDA:
como você teve acesso aos fanzines pela primeira vez?
Via aquelas resenhas na Animal, na Chicliete com Banana... mas acabava nunca escrevendo. Só criei coragem pra começar a me corresponder quando houve aquele “boom” de zines na Bárbaras Magias e na Berinjela, aqui no Rio, nos idos de 1993 - 1996...

como você teve acesso ao rock? como era curtir rock no méier?
Sempre tive uma banda de Rock na minha rua, que deu origem ao já clássico Plante Suas Sementes. Sempre escutei Rock estranho. Conheci Velvet Underground com 10 anos. Com 11, comprei o “More” do Pink Floyd. Com 9, escutava “Thick as a brick” do Jethro Tull amarradão. Devia ter algum problema. Adorava sair da escola e ir pra lojas de discos conhecer materiais novos. O Underground, só conheci quando comecei a ter contato com zines. O pessoal com que eu andava curtia muito som, mas era meio cagão pra se arriscar saindo por aí... em 1989, com 13 anos, não tinha uma galera que pudesse sair junto... aí, afogava as mágoas estragando festas da rua, botando pra tocar no meio de aniversários de amigos Porcupine do Echo & the Bunnymen... 

algum point inesquecível q tenha frequentado no rio?
Do Méier, teve o clássico e efêmero Bar do Céu. No período 1995 – 1998 foram muitos. Frequentei Garage (clássico dos clássicos); Beco da Bohemia (Botafogo); Casarão Amarelo (Copacabana); Rato do Rio (Bangu); 311 (Bento Ribeiro); Bar da Sônia, no finzinho (em Deodoro);e uns locais em Campo Grande, em Jacarepaguá, todos já encerrados. fui em cada lugar destes umas cem vezes. Mas o Bar do Céu foi mais marcante, porque foi fechado por uma invasão da polícia fortemente armada, uns 30 soldados de fuzil na mão. Algum vizinho irritado com o ambiente deve ter telefonado pro disque-denúncia dizendo que a sede do tráfico do Rio de Janeiro era ali...

voce gosta de viajar? me fale de uma viajem?
Gosto de ler aonde pacotes de biscoito são embalados e sinto vontade de conhecer a cidade. Acabo viajando assim.
Você fez essa pergunta para que eu conte meu ato de lezação máxima: a viagem mais insólita foi quando fui pra SP e fiquei sem o dinheiro de volta. Tentei comprar uma passagem pra cidade mais próxima do Rio e de lá dar um jeito. Só que confundi “Jacareí” com “Jundiaí”. Aí, acabei indo mais longe que antes, e ainda ficar sem um puto no bolso. Tentei pegar carona e não consegui. Um policial ficou desconfiado e quis me prender. Contei minha história, e o policial sentiu tanta pena que me pagou a volta pra SP. Daí, pedi emprestado uma grana pra um parente, e voltei pra casa.
é verdade que você já trabalhou em uma loja de discos?
Sim, numa loja especializada em Rock progressivo. O dono era tão neurótico de que roubassem os discos que não aguentei mais. Gravei coisa pra caramba de lá. Vendi umas 15 cópias do “Solo” do Kaipa, difícil alguém conseguir convencer tanta gente a comprar um disco tão desconhecido.

fale-me da criação do personagem Arlequim e da participação de seu irmão na historia.
Queria fazer algo diferente do que lia no Brasil, com seus Super Heróis forçadamente nacionalistas. Daí, por alguma voz estranha e um disco do Genesis (Nursery Crime), resolvi falar de um mundo aonde todos os contos que lemos são na verdade manifestações dos personagens, que nos levam a escrevê-los. As personagens do Sítio do Pica-pau Amarelo aparecem adultas, Pedrinho usa drogas, o Homem de lata se torna um megalômano romântico e Emília é a guardiã deste mundo. Prenunciei “Fables” em uns 6 anos. Meu irmão ajudou em todo o design original, desenhos, histórias, e tirava xerox no trabalho dos zines. Foi muito importante nas 10 primeiras edições.  

Como foi ter ganhado um premio e ter seu livro publicado pela marca de fantasia?
É, “Arlequim” ganhou o Prêmio Nova de melhor quadrinho de 1998, um ano antes do Holy Avenger. Isso abriu muitas portas pra mim, mas não busquei nenhuma editora por ser meio lesado, sei lá. A Marca de Fantasia me procurou para lançar um álbum, e fiquei feliz, Arlequim merecia uma edição luxuosa que eles são capazes de fazer.

é verdade que você já vendeu gibis de sacanagem para poder sobreviver?
Já vendi X-men pra sobreviver. Os de sacanagem, foi pra ficar rico. Foi o  momento em que o underground pagou minhas contas. No auge do movimento “anime”, encontrei umas versões pornográficas de séries famosas. Achei divertido lançar uma versão traduzida, e foi um sucesso. Por mês, tinha que lançar 2 títulos novos, e com tiragem inicial de 25 exemplares, já reservados. Parece pouco, mas pra mim vender 50 zines em dois dias todos os meses ainda é algo surpreendente. Lancei 78 títulos diferentes. No momento estou voltando a lançar, mas a procura não é mais a mesma, e ando sem paciência pra divulgar como antes... quem quiser catálogo, ainda tenho tudo...


Além do arlequim que fanzines você ja fez?
Fiz um monte de “one shots” de quadrinhos. Fiz um zine chamado “Gotas” só para Rock underground, precisava deles, pois queria que “Arlequim” falasse apenas de literatura. Devo ter lançado mais uns 40 zines diferentes desses outros estilos. Mas, só música e quadrinhos. Nunca fiz zine e poesia, por exemplo...

Você tem ou teve algum projeto sonoro?
Toquei no Plante Suas Sementes, fazendo letras e vocal. Eles lembram muito Live, Pearl Jam. Gostava do ecletismo dos membros – Júnior (guitarra) curtia Soundgarden e Blues; eu curtia Progressivo; e Bogato (bateria) curtia Death Metal. Atualmente, toco o projeto noise performático Pesadelo Portátil. É gravações em loop, rádio, teclados tocados de forma aleatória, muito louco. www.palcomp3/pesadeloportatil  tem algumas coisas pra se ouvir e ver...

È verdade que voce começou com a Caza da Zorra? E que você teria saído pois eles queriam explorar as bandas?
Não vou lavar roupa suja aqui, mas, foi sim. No início, eu pagava as bandas, mas aí entrou um outro colaborador acostumado a explorar quem não era de sua panela, que infiltrou a semente do capitalismo selvagem na parada, aí desandou tudo.


Como foi depois de mais de uma década de produção artistica você entrar no IART da UERJ? as paredes e mentes continuam mortas? existe vida lá?
Fui apresentado a outras possibilidades... foi importante. Mas, o mais importante, foi não deixar o que já fazia. É muito fácil você repetir o que diz os livros como um papagaio e se deixar morrer. Isso, pra minha sobrevivência, consegui não deixar que aconteça.  Mas, lá tem mais zumbis que um episódio de Walking Dead. Deve ter vida lá, só que sempre me decepciono...


Já fez fanzines em lugares públicos?
Não. Lugares públicos guardo pra fazer sexo.

Voce prefere doce ou salgado?

Prefiro me masturbar.

Qual técnica você utiliza em suas HQs?

usei nanquim e pincel demais. Devia experimentar colagens. Tentei usar funções psicológicas das cores, mas, como ninguém entendeu nada, desisti.

Quais seus autores de HQs favoritos?
Jaime e Gilbert Hernandez me apresentaram tudo. Grant Morrison me mostrou que super heróis pode ser legal. Alan Moore me mostra que quadrinhos também são poesia. Tem mais um monte de gente, mas estes três me mostraram possibilidades mais ousadas...

O que você acha do kraut e do post rock?
Post Rock é Kraut Wannabe.

Obrigado deixe sua mensagem e adquira conhecimento!
Esta entrevista ficou muito grande. Queria responder como os caras do Vermes do Limbo, que sintetizavam tudo em uma frase, mas isto ficou muito grande.  Essa geração Twitter escreve pouco, não sintetiza. Na net, tudo vira grande verdade. Deveria ter me matado quando tive chance. Salvem o mundo, cometam suicídio. Questione tudo que lêem.

 

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